sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Menina-mulher


Tinha um ar austero. Não dava confiança com facilidade, mas gostava de brincar com os mais chegados. Era uma rapariga simples, com hábitos simples e objectivos também eles simples. Mulher de rotinas, sim, já era mulher. Ia para a escola de pasta debaixo do braço e estudava afincadamente para conseguir o que queria. O mal dela era sonhar. Sonhava muito, sonhava demais. Gostava de se apaixonar. Gostava e assumia-o. Mas nunca encontrava o 'tal' e quando o encontrou não se apercebeu. Conheceram-se, mas não se apaixonaram logo, levou o seu tempo. Quer dizer, ele apaixonou-se primeiro, mas ela não se quis deixar logo levar e ficou na retaguarda. Levou tanto tempo quanto o necessário para ela se dar por completo. Ficavam bem juntos, ficavam muito bem juntos, aliás. Eles entendiam-se às mil maravilhas; discutiam naturalmente, mas os sorrisos, os beijos trocados, os abraços envolventes, as carícias partilhadas, tudo compensava alguma ponta de ciúme ou insegurança que pudesse existir na relação. Eram felizes e apaixonados. Mas um dia tudo acabou. E o "para sempre" ficou muito à quem do esperado. Ela nunca mais sorriu da mesma forma, nunca mais teve aquele brilho no olhar. Quer dizer, os olhos da rapariga voltaram a brilhar, mas não com a mesma intensidade. Houve noites em que ela encheu a almofada de água salgada. Houve vezes que precisou de olhar a Lua para se acalmar. Houve dias em que não pensava em mais nada, senão nele. Houve momentos em que não sabia como o tirar da cabeça. O facto é que tinha chegado ao fim, e ambos concordaram com essa realidade. Porém, assume-se que no fim tudo acaba bem, portanto se não está bem, é porque ainda não chegou o fim.
Naqueles dias em que a mágoa pesa mais que a vontade de viver, é a esta frasezinha que a menina-mulher se agarra. E digo-vos, não se tem saído mal.

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